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Somos hoje como que aguilhoados e impelidos para a solidão, para o isolamento.

Noutros tempos, apenas os livros faziam de algumas pessoas seres anti sociais, seres que buscavam a erudição no recôndito do seu quarto a cheirar a bafio. Estes eram os cromos ostracizados, que se incompatibilizavam com os comuns interesses corriqueiros da maioria. Mas hoje, os bichos do buraco não são os leitores, até porque, quem é que lê livros hoje em dia?

O isolamento acontece nos nossos dias com uma naturalidade desconcertante, uma naturalidade desobediente à essência da nossa sociabilidade, que contraria a nossa vontade.

O fruir das nossas ações, que pensávamos controlar, remetem-nos para o fantástico universo da “pixelândia” que nos arrebata e hipnotiza através dos écrans.

Vemos filmes em telas de 5 polegadas que adulteram todo o processo criativo dos cineastas; ouvimos música em micro colunas que se incorporam nos nossos orifícios auriculares; jogamos desafiantes partidas com o auxilio de um qualquer comando, que não nos fazendo transpirar o corpo, murcha-nos o cérebro; namoramos embalados por “sms’s”, envio de “nudes” e vídeo chamadas que facilmente falseamos; observamos pessoas sem sair à rua, sem ir à esplanada com o auxílio dos músculos do polegar, dispondo de uma fabulosa técnica que se resume a um “cola, arrasta e descola” nas telas dos “smartphones”; as compras fazemo-las à distância, ao ritmo das plataformas de vendas, promovidas por algoritmos que não dominamos e que muito menos entendemos, até porque matemática nunca foi o nosso forte; as ruas que não conhecemos já não se perguntam, porque dispomos de um assistente electrónico que parece gente para nos indicar os sítios; os restaurantes investem em motoretas para que os seus estafetas nos tragam as refeições a casa, em vez de investirem em mesas para nos servir nos seus aprazíveis espaços; estudamos, trabalhamos e formamo-nos com o auxilio de ferramentas de vídeo que dispensam a nossa presença desabituada nos locais de trabalho e nas salas de aula.

E como se isto não bastasse, fruto da nossa desabituação em interagir com semelhantes, consideramos abusivo e desconfiamos de quem nos aborda para perguntar um destino, para vender um objecto, para pedir a nossa ajuda para uma qualquer instituição de caridade ou até mesmo desconfiamos, de quem genuinamente nos quer ajudar nalguma dificuldade.

E a machadada final, que promove este desolador isolamento e mais do que isso, legitima a falta de educação, estamos com medo de morrer contaminados por doenças que se transmitem por gotículas de saliva e por isso evitamos estar com pessoas, ignoramos quem connosco se cruza na rua, despachamos contatos sociais com um “olá tudo bem” sem esperar resposta.

É urgente sair de casa, estar com semelhantes; ir ver filmes às intimistas salas de cinema; assistir a peças de teatro nos anfiteatros; ouvir música em colunas gigantes que democraticamente distribuem os seus decibéis; trocar as pantufas pelas sapatilhas e ir lá para fora correr, saltar, lançar, chutar, transpirar a sério e oxigenar o cérebro; ir à procura de emoções reflectidas no olhar de alguma alma gémea que desacreditavamos existir; ir para as lojas físicas decidir uma compra tateando e contar com a ajuda de um conselheiro especializado; ir para a rua ver pessoas, perguntar pelos sítios, descobrir os recantos; ir aos restaurantes saborear a comida acabada de sair do lume; ir trabalhar para as empresas e socializar junto da máquina do café ou da fotocopiadora; ir para as salas de aulas questionar os professores ou fazer alguma diabrura que obrigue o professor a impor a sua autoridade.

Faz-nos falta sentir pele, inalar odores, interpretar olhares… faz-nos falta estar em contato com a verdade!

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