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Teclado hcesar – Fórmula

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“Quando fazemos projetos para a nossa vida Deus ri, quando fazemos projetos para a vida dos nossos filhos Deus dá gargalhadas!”.

Considero esta frase deliciosamente divertida e carregada de uma ironia desconcertante. E gosto particularmente dela pela forma como coloca em confronto a individualidade de cada um, com aquilo que a cultura vigente define como caminho e também com a sorte, o acaso.

Não acredito no destino, na ordem cósmica que nos determina a fatalidade. Tenho a certeza que temos influência no caminho que vamos trilhando. Embora não partámos de uma folha totalmente em branco, podemos escrever por cima, escrever à volta, rasurar aquilo que lá está escrito e dar um novo rumo, com o nosso cunho, com a nossa assinatura.

Esta construção é desafiante, a projeção de futuro a que nos propomos e ousamos querer para a nossa vida é legitima. Pena é que essa fantasia seja muitas vezes determinada por uma receita excessivamente cara e pouco criativa. E também por se tratar de uma idealização que advém de uma proposta exageradamente conservadora e convencional, que limita e castra de forma mesquinha a nossa individualidade.

E essa idealização conformada arrasta consigo outro erro que é o de nunca vivermos o presente e estarmos sempre projetados no futuro.

Estimulámos as crianças a pintar livros de colorir com todas as cores do arco-íris, depois aos adolescentes e jovens damos dicas para que sejam cinzentos, para não alimentar perceções desviantes nos olhares dos policias do bom comportamento.

E depois respeitando a fórmula, desde muito cedo tios, tias, vizinhos, amigos começam a perguntar às meninas por namorados e aos meninos por namoradas; quando estes pouco mais que adolescentes se enamoram por alguém e são correspondidos acenam-lhes com a fabulosa idealização romântica do casamento; assim que se consuma o casamento são impelidos a ter filhos, porque um casal sem filhos não está completo; quando nasce o primeiro filho impingem-lhes a ideia de que será indispensável ter o segundo e talvez o terceiro.

Em paralelo a esta sequência de etapas, exigem que estudemos mais do que quem nos exige esta demanda estudou, que tiremos um curso que mais que felicidade nos traga estatuto, daqueles cursos sérios com saída e não nos deixemos iludir por vocações ou gostos; exigem que tenhamos uma profissão digna, não daquelas ligadas às artes ou às performances que essas não são futuro, a não ser que seja jogador da bola porque as aspirações a Donas Dolores’s são irresistíveis; que pensemos em ter um carro que legitime a nossa independência; que aforremos para ter uma casa que albergue a família que almejamos construir; que de seguida troquemos por um carro mais seguro, mais impactante de acordo com a nossa classe social; e que nos enterremos em compromissos para obter uma casa ainda maior que ateste o nosso intocável sucesso.

E atenção, que este caminho se vá construindo solidificado em honestidade, a não ser que seja roubar uma TV Cabo pirata ou enganar uma seguradora porque isso não é pecado; que sejamos generosos e publicitemos uma qualquer ação que ateste este nosso bom coração; tenhamos o brio de honrados trabalhadores que ganham sempre abaixo da sua real valia; que não tenhamos vícios que isso dos vícios é dos fracos de espírito; ah e não esquecer de sermos heterossexuais que essas modernices de hoje são um pouca vergonha; nada de piercings em sítios estranhos ou tatuagens a estragar o corpo e que usemos roupas decentes. E se não conseguirmos corresponder a todo este rol de demandas, que consigamos disfarçar e pelo menos parecer…

E Deus vai rindo!

E desta forma seguimos o nosso projeto de vida, que mais que nosso é dos outros, é a fórmula das pessoas de bem.

De seguida frustrados por um sem fim de irrealizações, fazemos projetos para os nossos filhos, afogamo-los em ansiedades por aquilo que exigimos deles, fazendo-os sentir insuficientes e que não estão a corresponder ao que esperamos deles e…

Deus dá gargalhadas!

 

 

 

 

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