É sempre um exercício difícil e desonesto dividir algo em apenas duas partes, duas formas, dois modelos. A dicotomia facilita-nos a forma como arrumamos algo nas nossas prateleiras mentais. Mas isto de, ou és uma coisa ou és necessariamente o oposto, é redutor, injusto e muitos exemplos poderíamos elencar a justificar isto que digo.
Mas hoje apetece-me colocar à vossa apreciação uma ideia com que gosto de dividir as pessoas que vamos conhecendo, que por alguma razão se vão cruzando connosco ao longo do nosso percurso.
Algumas são verdadeiros tsunamis, que nos atropelam positivamente, com as quais ficamos completamente arrebatados e com quem queremos partilhar experiências, porque as imaginamos tornarem-se memoráveis.
E outras entram na nossa vida como uma brisa discreta, cuja frescura é agradável, mas que nem sabemos ao certo de onde é que ela provém, cuja a ausência não notaríamos sequer, não daríamos pela falta.
As primeiras são como uma música pop com aquela batida contagiante que nos agarra, que não conseguimos deixar de sentir a sua presença invasiva, são como um filme hollywoodesco que nos estonteia com explosões e perigos iminentes que irrompem e desobedecem aos limites da tela, são como uma história de amor ou de ódio que nos prende sem exigir esforço interpretativo, ou são como um livro que explora os afectos e cujo o título nos remete para o amor próprio, com que inevitavelmente nos identificamos seja qual for a fase da nossa vida.
Os segundos, são como um longo concerto sereno, que te agarra num todo e não apenas na apoteose de um “hit”, são um concerto sem explosões de luzes, sem batidas corriqueiras e sem corpos seminus, mas que reclama a nossa atenção e nos acomete para uma tranquilidade prazerosa, são como um filme que precisas de ver mais do que uma vez e a cada nova visualização encontras algo novo e incrivelmente sedutor nas subtilezas da trama, são como uma obra literária que não te enreda pela tresloucada catadupa das situações, mas pela introspeção que te reclama, pela imperativa identificação das camadas de cada personagem que nos embalam e estimulam a cada página.
Os primeiros entusiasmam, divertem, tem o fulgor de gerar momentos de grande paixão e têm a capacidade de assoberbar o espaço e gostam da tua forma de ESTAR.
Os segundos são discretos, assentam a sua ligação na profundidade, tocam-nos em recantos que habitualmente não nos permitimos expor levianamente, são densos e surpreendentes e gostam da tua forma de SER.
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