A abertura dos Jogos Olímpicos de Paris foi diferente, foi ousada, foi um autêntico vaudeville que só mesmo os franceses poderiam conceber.
Bem-vindos a Paris, mes amis!, onde 85 barcos transportaram mais de 6 mil atletas através do rio Sena renascido para este espetáculo.
Dizem os mal-amados, estes eternos invejosos da felicidade alheia, que foi uma abertura fraca, principalmente para quem estava lá, in loco, debaixo de chuva. Creio que sim, mas ora, 300 mil pessoas nas ruas de Paris – além daquelas debruçadas nas tradicionais janelas e sacadas da cidade luz – é, por certo, uma celebração do povo, para o povo, bem diferente das 50 mil pessoas que conseguem comprar um ingresso – e pagando uma fortuna – quando a abertura dos Jogos se dá dentro de um estádio, ainda que olímpico.
Paris apresentou um grande teatro de variedade, “voix de ville”, a céu aberto, dia e noite, culturalmente dividida entre Victor Hugo e Toulouse-Lautrec, entre a arte sublime do Louvre e o can-can vulgar (sem esquecer os mais pequenos com um hilariante momento dos Minions em modo atletas).
Alguns conseguiram ver a Lady Gaga surgindo de trás de uma fila de leques com penas cor-de-rosa, essa Madame de Pompadour dos tempos modernos, vestida para um cabaré de primeira categoria. Outros tiveram a sorte de ver o mascarado – personagem que alinhava toda a narrativa – correndo nos telhados com a tocha olímpica.
Alguns puderam apreciar a “La Marseillaise” cantada pela mezzo-soprano Axelle Saint-Cirel, em pé, ao lado da bandeira da França, no telhado do Grand Palais. Outros puderam ver 10 estátuas de figuras femininas históricas emergirem das águas do rio, uma a uma, bem ali, aos olhos da Assembleia Nacional (pra bom entendedor…): Olympe de Gouges em defesa dos direitos das mulheres, Alice Milliat com a sua batalha pela inclusão de mais eventos desportivos femininos nos Jogos Olímpicos; Simone de Beauvoir com a igualdade de género, Paulette Nardal pela igualdade racial; Christine de Pisan e sua literatura medieval e a ativista francesa Simone Veill, primeira mulher a assumir a presidência do Parlamento Europeu.
E, diante tantas lutas, o que dizer da ousadia francesa em recriar Dionísio (e não a Última Ceia, como tantos histéricos do anti-wookismo andam por aí a propagar falsamente), num banquete com drag queens? Só mesmo os franceses para trazer esta mensagem clara de que estes Jogos são para todos, sem exceção.
Saindo da radiante Torre Eiffel e de volta ao Sena, a chama olímpica caminhou até à pira, não sem antes passar pelas mãos do centenário Charles Coste, um sinal de que os jogos olímpicos é um legado de memória e passado. Ao céu ascendeu um anel de chamas preso num balão de ar quente, um verdadeiro testemunho do espírito francês.
Grand finale! Enquanto o fogo olímpico subia aos céus, as primeiras notas da canção “L’hymne à l’amour”, de Edith Piaf, soaram e Celine Dion, qual fénix renascida, emergiu na Torre Eiffel para saudar Paris e os Jogos.
E assim, Paris deu o pontapé inicial nesses Jogos Olímpicos.
Paris, a capital do amor – e do desporto.