Ultimamente é comum ouvirmos dizer que o mercado de trabalho está a mudar. A verdade é que já mudou.
Aquilo que começou por ser uma mudança tímida da relação da pessoa com a empresa na entrada dos Millennials (chamada geração Y de quem nasceu entre o início dos anos 1980 e fim dos anos 1990) no mercado de trabalho, está a ser reforçada definitivamente com a geração Z (geração que nasceu entre o fim dos anos 1990 e 2010 e que entrou no mercado de trabalho nos últimos 5 anos).
Quem pertence à geração Millennial pode pensar nas gerações anteriores de trabalhadores olhando para os avós e para os pais. Em geral, os nossos avós trabalharam por subsistência, num país/ mundo pobre, não tecnológico e a recuperar de guerras mundiais destruidoras. O objetivo deles era a sobrevivência. Trabalhar para colocar comida na mesa da sua família. Deixar o emprego não era uma opção, fosse o emprego ou o “chefe” (ou ambos) maus.
A geração seguinte (tipicamente a dos pais dos Millennials), pôde ver um pouco mais além porque teve uma geração atrás que lhe resolveu os problemas de sobrevivência. Esta geração trabalhou para melhorar o nível de vida, os seus padrões. Trabalhou para comprar uma casa, um carro, férias, etc. Os seus padrões de vida aumentaram relativamente aos anteriores e apesar de poderem mais facilmente trocar de emprego, o que estavam a receber em troca do ponto de vista material valia a pena para se manterem nesse emprego, na maior parte das vezes. Esta geração não teve, na sua maioria, oportunidade de frequentar um curso universitário e tinha (também) como objetivo principal, dar essa possibilidade aos seus filhos (Millennials). Foi a última geração a ver o trabalho numa empresa como o empego para a vida.
Nas gerações mais recentes (na geração Millennial e com maior força na geração Z), cada vez mais vão sendo menos importantes as questões materiais em detrimento do bem-estar pessoal. Ora, esta noção de bem-estar pessoal é subjetiva o suficiente para cada um ter as suas razões para não se manter num emprego que, muitas vezes, não gosta e/ou não compreende. Acima de tudo, estes novos trabalhadores querem um propósito. Esta é a palavra-chave que atualmente parece que inunda tudo o que está ligado aos recursos humanos das empresas minimamente organizadas. Estas gerações, que viram os seus problemas básicos resolvidos pelas gerações anteriores (subsistência e qualidade de vida), não precisam de se preocupar com esses elementos primários identificados na base da Pirâmide de Maslow (esquema que organiza de forma hierarquizada as necessidades humanas) e podem preocupar-se apenas com as suas necessidades de realização pessoal.
Isto cria um problema numa estrutura empresarial formatada para o mesmo tipo de relações humanas que tínhamos há dezenas de anos. Aliás, a maior parte dos gestores de topo, são da geração dos pais destas duas últimas gerações (nascidos entre os anos 1980 e 2000), com a mesma cultura em que se envolveram no mercado de trabalho, cultura essa já referida atrás e consideravelmente datada.
Nos primeiros anos deste choque (até há cerca de 5 ou 6 anos), a esmagadora maioria das empresas em Portugal lidou com esta situação de forma autoritária, impondo a sua visão e cultura de forma unilateral e não compreendendo muito bem o que estava a acontecer. Podia fazê-lo, porque a taxa de desemprego média anual estava em crescendo, até um pico de 17.1 % em 2013. Para muita gente, foi quase um voltar ao conceito de trabalho da geração dos nossos avós – trabalhar para comer.
Mas as coisas mudaram nos últimos anos e hoje quem tem poder são os trabalhadores. Num momento em que as taxas de desemprego batem níveis historicamente baixos na maior parte dos países ditos desenvolvidos, as empresas começaram “a pôr pés a caminho” a tentar compreender o que vai na cabeça das gerações mais jovens para os poder reter. Provavelmente já ouviram todos estes chavões: retenção de talento, work-life balance, Chief Hapiness Officer, employer branding, etc, etc. De repente parece que as empresas (quem as gere) preocupam-se com as pessoas. Não é bem assim… As empresas estão preocupadas com a sua força de trabalho, o que é um pouco diferente, e tentam de tudo (incluindo palavras exibicionistas de origem anglo-saxónica) para cumprirem os seus objetivos de crescimento e lucro. E para isso, ainda precisam de pessoas (a sua força de trabalho).
As novas gerações mudaram de facto o mercado de trabalho e deram um passo em frente nas condições laborais e na relação das pessoas com o trabalho e com a sua vida pessoal. Não foram as empresas que deram o primeiro passo ao contrário do que muitas vezes fazem parecer. Foram obrigadas a fazê-lo, isto se queriam ter ou manter a sua força de trabalho. Este estado de coisas é válido num momento de pleno empego. Falta saber o que esperar (tanto para as empresas como para os trabalhadores mais jovens) quando não estivermos em pleno emprego…