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Em pleno século XXI, parece estar a consumar-se o estado de exceção como paradigma de governo. A política contemporânea, aparentemente, não consegue desenvolver-se sem um estado de emergência que se vai tornando permanente. Esta é uma prática de todos Estados, mesmo dos que são considerados como democráticos.

Esta declaração contínua do estado de emergência acontece, cada vez mais, alheia ao sentido técnico que lhe é inerente : uma exceção aos princípios constitucionais motivada por razões extremas que transcendem esses princípios, prevista e promulgada de acordo com os preceitos dessa mesma constituição no intuito de preservar o Estado a que diz respeito. O facto da criação e aceitação voluntária do estado de exceção vai incrementando a limitação do conjunto de liberdades que todos aqueles, que vivem em países onde o regime se traduz como democracia liberal, dão como adquiridos. O Estado, recorrendo a todo um conjunto de ferramentas, toma conta da informação e decide a forma como os cidadãos devem pensar  e atuar. O cidadão já não é aquele que elege quem melhor traduz o seu pensamento relativamente à sua visão política da sociedade, converteu-se no “animal humano” a controlar, num ser de racionalidade induzida. Uma indução que se viu na pandemia( que parece ter terminado, pelo menos em termos mediáticos) e que continua agora com a questão da Ucrânia. Que a Rússia tenha decidido o que os seus cidadãos possam saber sobre o assunto, talvez não seja uma novidade, no entanto, que os Países Ocidentais tenham feito o mesmo aos seus, não sendo, também, uma novidade deveria chocar. Pior, para além dos Estados, vemos entidades privadas a declararem, elas próprias esse estado de exceção : veja-se a atitude das grandes tecnológicas ( que se dizem promotoras do liberalismo global) neste conflito – imagine-se até onde pode ir este tipo de comportamento. A questão não está, como é óbvio, em tomar posição por um dos lados, mas sim em ter a possibilidade de o fazer, sobretudo de ter pensamento crítico sobra os acontecimentos,  algo que os regimes ditos democráticos apresentam como seu grande apanágio.

A indução vai ao ponto de, novamente, trazer mais nuances, aos princípios tão caros , ao mesmo tempo gastos e de algum modo irreconhecíveis, dos direitos humanos. Da obrigatoriedade da condição de cidadão, para que o ser humano seja portador de direitos, assiste-se à graduação dessa condição de cidadão: os refugiados são objeto de tratamento diferente conforme a sua cidadania, independentemente dos motivos que os forçaram a abandonar a sua pátria. Para casos similares, direitos diferentes, solidariedades diversas. Indiferenças cínicas relativamente a uns, caridade alegre e quase acéfala para com outros.

Exceção deve ser o limite que se impõe à ameaça do livre pensamento e livre expressão e não o cercear deste tipo de liberdade. Cegos por uma visão do tipo clubística, acabamos por não nos apercebermos do essencial e deixamos que o panótico se torne cada vez mais efetivo, mais atraente e tão voluntariamente opressor.

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