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A noite que trazemos…

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Ao chegar à última página de um livro extremamente pesado, o testemunho de Caroline Darian, a filha de Dominique e Gisèle Pelicot, sobre o que aconteceu com a sua mãe, drogada e violada por inúmeros desconhecidos… fica-me uma frase que sublinhei e quero guardar: “Escrever é dedicarmo-nos à noite que todos trazemos dentro de nós”.

E, porque é quase sempre assim, porque tantos e tantos estão repletos de noite, tento voltar-me para o que é visível, hoje.

Mesmo que não possa largar um tema próximo do que acompanhei neste bem recente testemunho, a causa dos direitos das mulheres, junto agora a causa dos direitos dos professores, dos alunos, da vida nas Escolas, que é também tema oportuno. Hoje…

Também não fiquei surpreendida com os resultados de um recente estudo efectuado e divulgado sobre a Escola Pública. Este estudo envolveu cerca de dois mil docentes e, parece-me, o resultado seria ainda pior se abrangesse um número maior de professores. Quase fiquei assustada!

De facto, a situação parece alarmante e, na descrição a que tive acesso, a Escola, algumas Escolas, quase se assemelham a um campo de batalha… Acredito que os resultados são fiáveis e assusta-me ver que cerca de 60% dos professores sofrem de bullying descarado, com insultos, desrespeito, ameaças físicas e verbais… Fiquei assustada ao verificar que essas ameaças partem de alunos sem educação, naturalmente, mas também dos próprios pais, o que é inadmissível! Igualmente, estas situações, não parecem ter resoluções eficientes e reparadoras e por isso, em muitos casos, as Escolas sofrem com o ambiente que se instala e que não é nada favorável ao processo do Ensino-aprendizagem. Constato igualmente que é confrangedor verificar que a maioria das Escolas, confrontadas com as graves situações em que os docentes são vítimas, não há respostas satisfatórias, não há solidariedade capaz de evitar situações difíceis vividas pelos professores. Pelos alunos, também. Pelos alunos que, descaradamente, são vítimas de bullying e que não deixam de ser vítimas de outros alunos insurrectos, incapazes de impedir que a impunidade prevaleça. Pobres professores e pobres alunos… Continuo a não ficar surpreendida e, por isso escrevo e o que digo entra nessa noite que todos trazemos dentro de nós…

Custa-me não escrever ou falar sempre bem da Escola que adorei conhecer… Custa-me sentir que a Escola, mesmo que não pareça, continue divorciada da vida de cada Professor e cada aluno merece viver… Hoje, sinto que a competição está a prejudicar o Ensino… Entristece-me que o aluno esteja a perder o gosto pelo livro, pelo papel, pelas frases sublinhadas e repetidas em cada página de um qualquer caderno que teria de ser usado para poder aprender… Hoje, parece-me poder sentir que cada um dos professores, esmagados pelo aparelho burocrático, pelas médias, pelas cruzes certas e erradas de cada teste de avaliação, perca o gosto pela leitura, pelo que tem de ler e estudar para depois  poder ensinar… Hoje, a Escola parece-me muito mais divorciada da vida, muito mais afastada da leitura e, consequentemente, da imaginação…

Anos atrás, senti-me triste por ter deixado a Escola… Já não sinto. Percebo que para muitos alunos e Professores a Escola é quase “uma seca”, porque também desperdiça alunos que devem ou deveriam ser mais ouvidos, mais estimulados, mais apreciados! Porque eles são o futuro e porque, muitos deles, ainda querem mudar o mundo! Neles, nesses alunos eu continuo a acreditar e por isso sinto que eles merecem ser apoiados e, felizes!

Como disse Saramago, “sente-se uma insatisfação, sobretudo dos jovens, perante um mundo que já não oferece nada, só vende.” Acredito nisso!

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