Modelo Opiniao

Durante quase duas semanas, foi pedido aos líderes dos principais partidos que, em aproximadamente 30 minutos (15 para cada um), debatessem os futuros quatros anos de governação. Eram 30 minutos para discutir as mais de 35 mil horas que o próximo governo terá pela frente para governar o país. A ideia era clara: uma injeção de medidas discutidas avulso, com alguma demagogia à mistura, muito sound-byte e click-byte , e mais horas e horas de comentário sobre aqueles inauditos 30 minutos com painéis de especialistas em comunicação, comentadores políticos e delfins partidários em modo propaganda. No dia seguinte, novo debate, novas manchetes jornalísticas, nova pontuação à prestação, novas reações em tempo real…e mais 30 minutos passados sem que se tenham realmente percebido e discutido as medidas verdadeiramente estruturantes para um país pleno de carências.

Longe vai o tempo das 3 horas, 40 minutos e 52 segundos do maior debate alguma vez transmitido na televisão em Portugal. Foi em 1975, entre Mário Soares e Álvaro Cunhal, em vésperas do 25 de novembro, num tempo de “Verão Quente”. Agora, embora o aquecimento global seja uma realidade, o verão tem-se mantido ameno e constante no nosso país nos últimos anos; o canal de televisão já não é só a RTP; a desilusão com as governações tem aumentado e, sobretudo, a qualidade dos políticos e do debate político é reduzido. Arrisco até dizer, medíocre. Quanto ao jornalismo, também esse perdeu a aura de outros tempos gloriosos, onde o rigor, o escrutínio, a audácia, a inteligência e o interesse pela causa pública tornavam o jornalista e o jornalismo uma fonte de informação credível e segura.

Hoje entrega-se à agenda política e económica dos grandes grupos de comunicação, balizada pelos trends das redes sociais, tentando sobreviver à selvajaria de um mundo onde as fake news proliferam a cada milésimo de segundo.

O que sobra no final? Ideias populistas e demagógicas, mentiras manobradas para soarem a verdades, ilusionismos económicos e muita, muita desinformação e desconhecimento…

Proliferam pelas redes sociais as frases feitas, o quem chamou mais mentiroso ao outro, mais ladrão ou foi “mais agressivo” (utilizando uma linguagem comentarista e bélica), cujos critérios se vão alterando consoante o quadrante político.

É este o formato de debate que queremos? Estamos conscientes da porta que abrimos ao empobrecer a discussão política? Curiosamente, foi entre os mais jovens que vi maior indignação aos 30 minutos de debate. Aqueles que são normalmente acusados de navegarem ao sabor das redes sociais, do conteúdo imediato, das short stories, são os mesmos que querem escrutinar com maior rigor e inteligência os seus representantes políticos.

São a geração com mais formação que alguma vez o país teve. Mas são os mais afetados pela desinformação e crise atual das instituições. Talvez por isso queiram que os programas e as ideias políticas sejam bem debatidas, esclarecidas, confrontadas. Onde impere o rigor jornalístico, associado a um maior escrutínio e inteligência na condução do debate.

No final, estamos a falar do futuro governo do país. De mais de 35 000 horas de governação, onde 30 minutos não podem ser aceites como suficientes para discutir um país. A cultura do debate perde-se e degrada-se num mundo onde pouco se conversa, mas muito se discute.

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