Realidade não real, de realidade real.
Acabamos de jantar. Vamos ligar a televisão.
Ouvi, num dos pisos, vozes. Uma masculina e outra feminina. Ouvir-se o que se passa em outros apartamentos não é surpreendente. Mas o volume agrava-se. Ouvi um choro de criança. As vozes passam a gritos… deixei de ouvir a criança chorar.
Em mim tudo palpita.
– Que faço?
Como deixa uma criança de chorar quando os gritos continuam?
– Devo ligar para algum lado?
– Para onde?
E o que se segue a esse telefonema? O que vai acontecer? (Isto depois de encontrar o sítio adequado para ligar) Alguma autoridade vai bater a alguma porta e perguntar o que se passa? A que porta? Nem eu sei de onde vinham as vozes alteradas.
– Vêm bater na minha porta? Vão aguardar que se oiçam novamente vozes alteradas? Quanto tempo demora uma autoridade a chegar ao “meu” prédio? Não, não se voltam a ouvir as vozes alteradas. Mas é o silencio, depois do choro, da criança, que me matuta na cabeça…
– Como é possível que tenha parado de chorar?
– Devo ficar calado?
– Devo ouvir o que me ecoa:
– Não te metas… (Entre marido e mulher, não metas a colher…. Dizem que o Povo é sábio)
– Não te diz respeito…
– Vais meter-te em trabalhos…
– E nem sequer sabes de onde vêm as vozes alteradas e o choro da criança…
Vou ouvir o telejornal. Depois durmo. Tudo indica que o “problema” se “resolveu”.
O dia seguinte “acordou” “normal”. Depois de uma noite em que todos dormiram “normalmente” …
– E se votar a acontecer (embora, agora, tenha a certeza que não foi a primeira vez que ouvi…)?
Vou voltar a ver o telejornal, com as notícias repetidas sobre assuntos longe de mim…
Vou voltar a dormir normalmente…
Esperando acordar normalmente…
E se um dia destes as notícias do telejornal me parecerem familiares? Próximas…