Com a guerra na Ucrânia chocamos, mais uma vez, de frente com complexidade da empatia. A empatia é essencial na nossa realização como seres humanos, de outro modo, todas as nossas ações se direcionariam pela sua utilidade, quer dizer, pouco nos diferenciaria de máquinas. No entanto, a empatia traz perigos porque carrega com ela o preconceito.
Hans-Georg Gadamer, explica-nos no seu livro “Verdade e método”, a diferença entre pré-conceito e preconceito. Fá-lo na tentativa de reabilitar o preconceito, já que ele possui um lado positivo e um lado negativo. Assim, o pré-conceito absolutamente necessário às tomadas de decisão que ocorrem a cada instante, perante o viver contingencial, por parte de todo o ser humano, só se torna preconceito (no sentido pejorativo) quando não é sujeito à crítica, portanto, à sua avaliação ética. Ética tida como reflexão da relação do eu com o outro, isto é, da reflexão sobre a moral.
A contemporaneidade tem-se mostrado propícia à tribalização em todos os domínios. O ato reflexivo é estonteantemente abafado pela velocidade do instantâneo. O peso da tradição consuma-se, em algumas instâncias, na plasticidade: do“ sempre foi assim”, do “ancestralmente” , do“ é antigo tem valor”. A tradição, está impregnada de empatia até pelo efeito agregador que ela tem. Como tal, tem que ser sujeita à “destruição” como Heidegger, Walter Benjamin, Karl Kraus e muitos outros notam como absolutamente necessária. Mas, não se trata de destruir a tradição, mas sim sujeitá-la ao mesmo processo de crítica acima elencado.
Não é possível pensar uma sociedade com diminuição de desigualdades, sejam elas de género, de raça ou quaisquer outras, sem ter em conta este processo a que deve sujeitar o que carrega o pré-conceito. Está nas nossas mãos essa construção ética de evitarmos que este se torne no preconceito que todos abominamos, que a empatia sirva mais o cavar de fosso entre o que é ser pessoa (como cidadão) e o que é ser humano. Não se trata de uma questão de justiça que necessita de um terceiro nesta relação do eu com o outro – o terceiro que serve de árbitro – mas sim, repito, de uma questão ética, que nestes dias, nos devem levar a refletir já não apenas sobre o ser humano, mas sobre o universo na totalidade. Já não é possível problematizar o viver sem percebermos que fazemos parte de um todo. Um todo que é o mundo, tudo o que nos rodeia vivo ou não vivo.
Diria que a tarefa em causa não é apenas tarefa da educação, tida como o sistema de ensino, mas sim de todos que deve englobar: a comunicação social, os políticos, os vários órgãos de soberania, todos os cidadãos, etç. A empatia alimenta a emoção, a qual, para se tornar benigna ao relacionamento humano, tem de ser sujeita ao trabalho critico que compreende as componentes da razão e espirituais – no fim a verdadeira construção de todo um novo humanismo que tão necessário se torna.
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