Sem saudosismos… mas com memórias…
Já lá vai algum tempo. Mas nada de transcendente. Durante toda a minha infância foi assim. Quem dava as prendas era o Menino Jesus… Deixávamos um sapato na lareira em véspera de Natal e íamos para a cama, mas só o cansaço da vigília (tentávamos ouvir o que quer que fosse para ter a certeza que o Menino Jesus tinha vindo) nos fazia adormecer. Era com espanto e surpresa que, no dia seguinte, bem pela manhã, verificávamos que o Menino Jesus tinha passado por nossa casa e nós não estávamos atentos. Ali estava a prova… as prendas no sapatinho. Entre outras coisas, nunca se esquecia de deixar um punhado de pinhões, pinhões com casca, bem negros. Com uma pedra (tradicionalmente, um peso de balança) lá partíamos a casca e deliciávamo-nos com o manjar mais especial… mesmo que na véspera tenhamos comido muitos. Depois dos rituais de aquecer as pinhas na fornalha do fogão de lenha, batê-las na pedra da lareira e apanhar os pinhões que elas deixavam cair, era tempo de tirar a casca exterior e retirar, também, a fina membrana que protegia o miolo. Havia pinhões nos “formigos”… Mas os que realmente interessavam eram os do sapatinho.
Outra memória… talvez com saudosismo… era a Missa do Galo, ou Missa da Meia-noite. Saíamos de casa e íamos, noite escura (e fria) engrossando o cortejo de gente que se dirigia para a igreja… muitos traziam lampiões e iluminavam o caminho. Os mais pequenos encontravam os amiguinhos e iam todo o caminho em correrias entre os adultos, que conversavam animadamente. É certo que o comportamento de alguns, depois da ceia de véspera de Natal, bem regada (e pouco comida…), não era o mais adequado para a Casa do Senhor… Havia, frequentemente um grupo que “inusualmente”, se instalava no coro-alto e era um forró todo o tempo. E por isto, para tristeza de muitos, que nada tinham a ver com esses comportamentos, deixaram de poder usufruir desse momento em que todos eram mais iguais que nos dias comuns e todos falavam com todos… Aqui e ali foi deixando de haver este momento em que a Casa de Deus estava aberta aos seus filhos para uma visita em momentos mais descontraídos, provavelmente mais verdadeiros.
Na época, Portugal era um país de católicos… mas havia ricos e pobres… católicos iguais mas pessoas diferentes. Sobretudo, crianças ricas e crianças pobres!
E o tempo foi pondo a estrela a guiar o Reis Magos, não para a modesta gruta onde nascera o Filho de Deus, mas a guiá-los para as cidade, para as casas do pai-natal…
O tempo passou e a cidade iluminou-se… O brilho de montras e vitrines fazia os olhos dos sonhos ganharem luz.
Continuamos a ser um país de católicos… e continuamos a ser um país onde há crianças ricas e crianças pobres (sim, todos sabemos que não é só cá… ).
Quando adorávamos o Menino Jesus não conseguimos mudar o que realmente era importante. Adoramos agora o pai-natal… e não se adivinha que consigamos mudar o que é realmente importante…
Quem teremos de adorar para que o realmente importante seja o mais importante? A todos um Bom Natal!
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